quinta-feira, 21 de abril de 2016

Deixa as mina

Como a boa problematizadora que sou, simplesmente não podia deixar passar em branco a bola fora que a revista Veja  deu nessa semana.

Para começo de conversa, você nem precisa ler o texto em si pra sentir que está sendo sugada até a Idade Média. O subtítulo da reportagem já traz uma bomba de ideais ultrapassados: "A quase primeira-dama, 43 anos mais jovem que o marido, aparece pouco, gosta de vestidos na altura dos joelhos e sonha em ter mais um filho com o vice".

Pera. Quê?

Antes de prosseguir para a problematização, vou deixar alguns trechos da reportagem para que reflitam comigo.

"Marcela se casou com Temer quando tinha 20 anos. O vice, então com 62, estava no quinto mandato como deputado federal e foi seu primeiro namorado."

"Marcela é uma vice-primeira-dama do lar. Seus dias consistem em levar e trazer Michelzinho da escola, cuidar da casa, em São Paulo, e um pouco dela mesma também (nas últimas três semanas, foi duas vezes à dermatologista tratar da pele)."

"Michel Temer é um homem de sorte."

Não vou envolver política no meio porque esse link cada um dá conta de fazer sozinho.

A reportagem inteira tenta vender Marcela Temer como a mulher perfeita. Recatada, dona-de-casa, casou jovem com o primeiro namorado que teve, preocupada com sua estética. Michel Temer é um cara de sorte de ter esse tipo de troféu dentro de casa.

Mas e se ela não quisesse ser assim?

E se ela gostasse de usar roupas mais extravagantes? E se gostasse de trabalhar fora, talvez na política como o marido? E se tivesse namorado 17 caras antes de encontrar o que ela finalmente julgasse perfeito para casar? E se ela não se importasse com estética?

Se Marcela Temer fosse diferente, Michel Temer não teria tanta sorte assim?

Não existe a mulher perfeita. Existe mulher de um jeito, mulher de outro, todas são perfeitas e todas são mulheres. Nenhuma é melhor que a outra. Nenhuma deveria ser mais como a outra. E nenhuma definitivamente deveria se sentir inferiorizada por não ser tão parecida com a outra.

A Veja pecou ao fazer um texto para vender uma imagem que a gente já deveria ter deletado há muito tempo. Mulher não presta só quando está em casa, só quando é dona-de-casa, só quando é o troféu perfeito. Mulher não é comida para prestar, para ter validade, para ter jeito de ser. Mulher é ser humano com sentimentos, com ambições, com consciência. E a mulher pode sim querer ser Marcela Temer, assim como pode querer ser Kim Kardashian, Maria Eduarda de Oms, Julia Souza, Rafaella Gonzales ou qualquer outra mulher de qualquer outro nome que você consiga pensar.

Mulher é como mulher quer e se você tá incomodado, faz um robô e configura ele pra ter as atitudes que você julga ideais.

E, pelo amor de Deus, deixa as mina.

sexta-feira, 1 de abril de 2016

Das vezes que você entendeu errado

Existem pessoas e pessoas. Eu sou uma pessoa que não leva a sério sarcasmo nem ironia (a não ser que o comentário em questão tenha sido feito com o intuito de me ofender ou ofender alguém que eu gosto), e uso dessas figuras de linguagem livremente. Não porque quero ser grossa, mas porque sei lá. Dá vontade. Nem sempre dá pra segurar.

Mas aí você entende errado.

A pessoa liga no telefone fixo e pergunta "tá em casa?". Eu respondo "não, resolvi levar o telefone pra passear". A pessoa fica brava. Tive o intuito de ser grossa? Não tive. Fui? Não pra mim. Pra ela eu fui.

É cansativo ter que pensar o tempo todo em como vou falar com as pessoas porque elas podem se ofender. Umas não ligam para sarcasmo e ironia, inclusive também usam essas figuras de linguagem livremente, mas outras ligam sim. E fica chato ter que pensar com quais pessoas eu posso ser ironica e quais levam muito a sério e choram no banheiro, porque não quero ofendê-las. É chato ter que ficar policiando seu jeitinho pra agradar a gregos e troianos? É. 

Mas é mais chato ainda ter que se explicar para o grego que não está acostumado com seu jeitinho troiano de ser.

O negócio é adotar o deboísmo. Rir da ironia da pessoa quando você sabe que é apenas piada (porque ninguém leva o telefone pra passear, mas, francamente, precisava ter perguntado?), dar uns tapa quando ela fala por maldade, soltar os comentários quando você acha que o clima tá leve e ninguém vai levar a mal e respirar fundo contando até dez quando chegar a vontade insuportável de dar aquela espetada na amiga lenta que tá conversando com você.

Aliás, o negócio é sempre respirar fundo e contar até dez. É chato? É. Mas antes engolir o sarcasmo e deixar pra destilar seu veneno pelo twitter do que soltar na hora e se arrepender pelo resto do dia.