sábado, 24 de outubro de 2015

Das coisas que a gente não deveria ter que dizer

Aquele momento em que nem uma criança de 12 anos escapa dos comentários abusivos e nojentos feitos por homens que ainda acreditam que hoje, pelo século 2015 e ano XXI, mulheres não passam de objetos criados para seu deleite.

Se você é mulher, independentemente da idade, cor, porte físico ou classe social, muito provavelmente já foi assediada. Na rua, na escola, no shopping. Em casa. Foi um primo distante encarando suas pernas quando você estava de saia. Um garoto no shopping que ficou andando em círculos no andar que você tava e sorriu sugestivamente todas as vezes que vocês se encontraram. Um professor que fez algum comentário para alunos homens, a seu respeito, você estando presente para se defender ou não (caso verídico). 

Se você é mulher, provavelmente não pode usar certos tipos de roupa na faculdade ou no colégio. Se você é mulher, paga menos na entrada da balada - porque quanto maior for o número de mulheres lá dentro, mais homens serão atraídos para o lugar. Se você é mulher, "tava pedindo". Se é mulher, é "(insira qualquer adjetivo pejorativo relacionado à sua vida sexual, como se fosse do interesse de qualquer pessoa além de você mesma)". 

Se você é mulher... A lista segue. São milhares de coisas que podem (e vão) te acontecer se você é mulher. Mas meu foco não era exatamente esse.

Valentina, de 12 anos, é uma das 20 crianças participantes do programa MasterChef Júnior (competição de culinária onde pessoas podem demonstrar seus dotes e deixar a gente com água na boca e bem triste por não saber repetir o prato em casa). 

Valentina, de 12 anos, é uma das muitas crianças vítimas de comentários pejorativos na internet. Comentários de cunho sexual a respeito de sua aparência, de suas ações. Comentários feitos por homens, adultos, que estudam, trabalham.

Valentina, de apenas 12 anos, é uma das muitas vítimas da cultura do estupro.


Nós vivemos numa sociedade em que o estupro é justificado. Foi um "corretivo" para a mulher homossexual, quem sabe assim ela não se "corrige" e aprende a gostar de homem? Foi uma "lição" para a mulher que usava vestidos, quem mandou se vestir assim? Tava pedindo.

Nós vivemos numa sociedade em que o estupro é um crime aceito. É crime, mas ninguém vai acreditar que aconteceu se você contar. É crime, mas você pode ser escutada por um policial que vai te analisar, da cabeça aos pés, com uma cara de quem pensa "bom, mereceu". É crime, mas se for mulher feia, o criminoso merece um abraço. É crime, mas depende. 

A gente não deveria ter que dizer que é errado.

Não tem justificativa. Não tem motivação. Não tem razão. Aliás, se tem uma coisa que isso não é, é racional.

E, desculpa ter que dizer isso, mas abuso não é só quando você viola o corpo de alguém com um ato sexual. É abuso quando você encoxa uma moça no metrô, dando a desculpa de que "não tem espaço". É abuso quando você passa a mão pelo corpo dela. É abuso quando você tenta beijá-la à força numa festa, mesmo quando ela já te disse não (diversas vezes). É abuso quando você sugere que uma trabalhadora durma contigo para subir de posição na empresa. É abuso quando você faz chantagem emocional para sua namorada dormir contigo. É abuso quando você compra o consentimento.

Há diversas formas diferentes de abuso.

A gente não deveria ter que dizer que é errado.

Deixo, aqui, um apelo a todos vocês que continuam menosprezando vítimas de abuso: don't. Just don't.

sexta-feira, 9 de outubro de 2015

Dos vícios de linguagem (e outras coisinhas)

Eu sou o tipo de pessoa que não consegue terminar uma frase sem colocar "tipo" no meio. Vai completamente contra a minha natureza explicar uma situação sem gaguejar e soltar uns quarenta "tipos", enquanto estalo os dedos tentando lembrar qual a palavra que estava na ponta da língua mas pulou fora antes de eu conseguir dizê-la.

Também sou o tipo que detesta ter que começar uma fala sem colocar um "gente" primeiro. Significa que, provavelmente, eu não tenho intimidade com a pessoa com quem estou falando - e, nessas horas, eu travo. Também pode significar que a situação em questão é formal demais para o uso de gírias, então vou ter que contar os "gente", os "tipo", os gaguejos e parar de estalar os dedos.

Mas essa reflexão aí foi só um desabafo, não era exatamente o que eu pretendia com esse post.

Como de praxe, voltei só para pedir desculpas por ter abandonado o blog. Vou falar que não fiz nada de útil, que não sei porquê parei de escrever, que pretendo voltar com mais posts, que quero fazer atualizações regulares. Talvez eu diga algo sobre dar uma "repaginada" no Entrelinhas. Talvez mencione as metas feitas no começo do ano (das quais eu já abri mão), talvez conte que já preparei as para 2016 (bem mais simples e modestas, porque não estou no clima pra ficar prometendo coisas que não vou cumprir). Talvez eu diga várias besteiras, ou talvez eu diga apenas que a vida tem dessas.

Acho que eu nunca soube que não conseguiria manter um blog semanal, porque eu não sou dessas que sabe lidar com prazos. No dia a dia, sou obrigada a realizar trabalhos nos quais não estou nada interessada e entregar na data marcada. Tenho que lavar e secar a louça até o horário estipulado pela minha mãe, preciso fazer as tarefas um dia antes da apresentação, arrumar meu quarto antes de dormir não é opcional.

Logo, quando faço algo por prazer, eu faço no meu ritmo. No meu tempo. E sem prazos.

Olhando por esse lado (que eu, thank God, posso dizer que sempre soube que existia em mim), parece que sempre esteve muito óbvio que eu levaria o Entrelinhas exatamente dessa forma. Então, o fato de eu ter tentado estipular prazos e regras, só pode significar uma coisa: eu sempre vi o blog como uma obrigação.

Talvez seja porque nos primórdios da minha existência na blogsfera, eu atualizava meus trequinhos todos os dias. Talvez seja porque eu achava que precisava escrever com frequência, porque faria com que eu me sentisse melhor a respeito de qualquer coisa que estivesse acontecendo na minha vida. Mas things change. Friends leave. And life doesn't stop for anybody.

O que realmente acontece é que eu não sinto mais aquela necessidade de escrever posts enormes desabafando sobre os problemas do cotidiano. Gosto de compor uma musiquinha na minha cabeça, de fazer várias reflexões pesadíssimas quando estou indo dormir, de falar mal de gente otária no twitter... Mas não acho nada disso necessário. Faço porque quero, quando quero e onde quero. Não encaro como um compromisso, e nós nos damos bem.

Podemos concluir que meu primeiro erro foi achar que precisava criar um blog por necessidade. Gente, necessidade é o que nós fazemos no banheiro. Pra mim, escrever é um hobbie.

Acho que eu não sou tão escritora quanto acreditava ser há uns oito anos.

Entretanto, não sou trouxa de acreditar que admitir tudo isso me deixará mais "solta" para atualizar o Entrelinhas com frequência. Não vai mudar. A diferença é que eu não vou mais aparecer pedindo desculpas por ter dado chá de sumiço, quando não há nenhuma cláusula me obrigando a ser uma escritora assídua que cumpre prazos. Esses prazos não existem aqui. Eu vou, volto, sumo, reapareço, e faço isso no meu ritmo.

Quem quiser reclamar, não pode reclamar. Meu blog, minhas regras.

Acho que essa minha mania de encarar a escrita como uma obrigação já me trouxe muita coisa ruim. São dezenas de histórias, contos e fanfics parados por falta de vontade. Se eu não tivesse passado os últimos anos me iludindo de que é necessário escrever, muitos projetos já teriam sido concluídos (no tempo estipulado por mim e controlado por Deus).

(Abrindo um parênteses aqui pra voltar ao tema dos vícios de linguagem. Sei que parece que eu sou tri religiosa por causa das várias referências cristãs ao longo das minhas falas, mas é só mais uma das minhas várias manias. Não tenho religião nenhuma.)

De agora em diante, nada de transformar hobbie em coisa séria. Hobbie é hobbie, coisa séria é coisa séria. Misturar os dois não vai funcionar aqui.

É só isso, mesmo. Espero acabar o post especial do qual falei no último até dezembro, mas acho difícil. Se não rolar, vocês me veem na Retrospectiva 2015 (dois meses, gente. Passou que nem um sopro). See ya.